terça-feira, 26 de fevereiro de 2019

Funcionários da Microsoft defendem fim do uso HoloLens pelo exército



Uma carta aberta publicada por funcionários da Microsoft na última sexta-feira (22) cria mais um capítulo na história de tensões entre as decisões tomadas pela diretoria de grandes empresas e a consciência dos milhares de funcionários que trabalham nela.

A carta critica duramente um contrato de US$ 479 milhões que a Microsoft fechou com o exército dos Estados Unidos, no qual a empresa irá fabricar 100 mil headsets HoloLens que serão utilizados no IVAS (Integrated Visual Augmentation System, ou Sistema de Aumento Visual Integrado, em português), um projeto descrito pelo próprio exército como algo designado a aumentar a letalidade de suas tropas.

No texto da carta, os funcionários se mostram alarmados de, de repente, a Microsoft estar trabalhando para desenvolver equipamentos para que o exército dos Estados Unidos possa maximizar sua capacidade de matar pessoas, e que quando esses trabalhadores assinaram seus contratos não havia nenhuma cláusula alertando para o possível desenvolvimento de armas, e que por isso eles gostariam de ser ouvidos antes que a empresa resolvesse entrar também nesse mercado.

Endereçada para o CEO da Microsoft, Satya Nadella, a carta já foi assinada por mais de uma centena de funcionários da empresa, que não concordam com a entrada da mesma no mercado de armamentos. A carta ainda cita que ajudar a matar pessoas não é um uso aceitável dos equipamentos desenvolvidos por eles, e exige que a empresa não apenas quebre o contrato com o exército, mas abandone também qualquer armamento que possa estar sendo desenvolvido na empresa e crie uma política de se comprometer a nunca mais desenvolver nenhum tipo de tecnologia que pode ser usada como armamentos, além da criação de um comitê externo para garantir que essa política seja seguida à risca. A carta lembra também que, ainda que a empresa possua um processo de revisão ético que proíba o desenvolvimento de certos tipos da IA pela empresas, o projeto IVAS mostra claramente que ele possui uma falha crítica, já que não é o suficiente para impedir a criação de IAs que serão usadas como armas.

Os assinantes da carta ainda afirmam que, como funcionários e acionistas, eles não querem que a empresa se torne uma companhia que lucra com guerras e conflitos bélicos, e que por isso exigem que a empresa abandone todas as atividades voltadas para a melhoria do arsenal do exército dos Estados Unidos.

Em declaração oficial sobre o caso, um porta-voz da empresa apontou para uma postagem de outubro no blog da Microsoft, postado quando a empresa havia iniciado a disputa pelo contrato com o exército. Na postagem, a empresa afirma que foi uma decisão tomada baseada na opinião geral de seus funcionários, e que a empresa mantém sua posição de ficar atenta às importantes questões éticas do uso de IA para usos militares — uma mensagem que, basicamente, tenta se esquivar com afirmações vagas e que não responde a nenhuma das preocupações levantadas pelos funcionários em sua carta aberta.

Essa não é a primeira vez que um movimento de funcionários se coloca contrário às decisões econômicas de empresas quando elas não parecem levar o sentimento deles em conta. No ano passado, funcionários da Google se uniram e conseguiram barrar dois contratos controversos da gigante da internet: o Projeto Maven, que criaria uma IA para mísseis e drones que conseguiria distinguir pessoas de objetos, e o Projeto Dragonfly, onde a Google construiria um mecanismo de busca onde o governo chinês teria total acesso a todas as ferramentas de configuração e poderia censurar qualquer conteúdo sem precisar avisar para o usuário que haviam conteúdos que foram censurados naquela página de resultados (como o Google na China faz hoje).

Além disso, também não é a primeira vez que a Microsoft é criticada por seus funcionários por conta de seu trabalho com órgãos do governo. Quando descobriram que, no ano passado, a tecnologia da empresa estava sendo utilizada pela Agência de Imigração (que à época aplicava uma das políticas mais polêmicas e desumanas já vistas nos Estados Unidos, onde famílias de imigrantes eram separadas de seus filhos de modo forçado pelos agentes de Imigração e não havia nenhum controle para que essas crianças pudessem ser reunidas com seus pais quando eles fossem deportados — uma tática que, na prática, significava o sequestro de crianças praticado de forma oficial pelo estado) os funcionários da Microsoft também se revoltaram com a empresa e exigiram que ela parasse de trabalhar com a Agência.

Mesmo assim, na época os executivos da Microsoft defenderam a decisão tomada em ajudar a Agência de Imigração, e continuaram trabalhando com ela, apesar da reclamação dos funcionários. Se a história se repetir, podemos esperar que, mais uma vez, a preocupação daqueles que trabalham na Microsoft seja varrida para baixo do tapete também nesse caso atual.

Fonte: The Verge


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