O sinal de que um buraco negro está “se alimentando” de estrelas, poeira e gás é sua corona – a bola de luz branca que flutua sobre ele. Há dois anos, a de um supermassivo buraco negro perdeu todo o seu brilho de maneira abrupta, indicando que, talvez, ele tenha abocanhado mais do que poderia mastigar e engolir.
Em março de 2018, astrônomos do All Sky Automated Survey for SuperNovae (ou ASAS-SN, um programa automatizado de busca por supernovas que vasculha todo o céu noturno diariamente) observaram uma intensa emissão de luz vinda do Núcleo Galáctico Ativo (ou AGN, sigla em inglês) da galáxia Seyfert 2 1ES 1927 + 654, a 300 milhões de anos-luz, onde se encontra um buraco negro supermassivo.
A Galáxia Seyfert 2 1ES1927+654, captada pelo telescópio espacial alemão ROSAT.
“Era um AGN que conhecíamos; nada de especial. Então ele se tornou subitamente brilhante, e começamos a apontar outros telescópios, em outros comprimentos de onda, para observá-lo", lembra a astrofísica Erin Kara, do Massachusetts Institute of Technology (MIT) e coautora do estudo publicado agora no Astrophysical Journal Letters.
Sinais de bom apetite
A corona de um buraco negro é formada por gás ultra-aquecido e a intensidade de sua luz pode mudar em até cem vezes quando um buraco negro engole algo. A emissão de raios x é um subproduto desse processo.
Qual não foi o espanto dos astrônomos quando, depois da explosão registrada, essas emissões decaíram drasticamente até desaparecerem: em 40 dias, elas diminuíram para 1/10.000 do que eram. A queda foi tão vertiginosa que chegou a um centésimo do esperado em apenas oito horas, o que é surpreendente porque, segundo a astrofísica, “esperamos que mudanças de luminosidade tão grandes variem em escalas de tempo de milhares a milhões de anos".
"Foi tudo tão estranho que, a princípio, pensamos que havia algo errado com os dados. Não tínhamos ideia do que era aquilo; ninguém jamais havia visto qualquer coisa parecida”, disse o principal autor do estudo, o astrofísico Claudio Ricci, da Universidad Diego Portales.
Um chute antes da morte
A partir daí, as emissões de raios X foram retomadas lentamente; cerca de cem dias depois, se tornaram quase 20 vezes mais brilhantes do que eram antes do evento. Os pesquisadores ainda não sabem ao certo o que pode ter acontecido, mas uma das hipóteses levantadas é que a responsável pelo estrago tenha sido uma estrela, apanhada pela força gravitacional do buraco negro supermassivo.
Os astrônomos acreditam que uma estrela se chocou com o disco de acreção (pode-se ver, no desenho, a corona pairando sobre o buraco negro)
Em uma comparação feita pela equipe do MIT, seria como lançar uma pedra dentro de uma caixa de engrenagens: os pedaços da estrela, esmagada pela monumental gravidade, podem ter ricocheteado no disco de acreção (formado por gás quente detritos que giram em torno do buraco negro), fazendo com que tudo nas proximidades, incluindo a corona, fosse engolido – e essa colisão foi o que fez com que ele brilhasse intensamente.
Os detritos da estrela capturada dispersaram parte do gás, fazendo com que a corona do buraco negro desaparecesse.
O desaparecimento da corona só foi captado por causa dessa explosão. "Será que esse buraco negro supermassivo retornará ao estado em que se encontrava antes desse evento? Ou o sistema foi fundamentalmente alterado? Continuamos nossas observações para descobrir," disse o astrofísico Michael Loewenstein, da University of Maryland, e coautor do estudo.
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