Pode parecer um cálculo sem propósito – ou até impossível de se fazer –, mas os cientistas conseguem estimar o “peso” do Universo, uma vez que essa informação permite a eles desenvolverem uma porção de estudos e levantamentos sobre o cosmos. Obviamente não se trata de uma “conta” fácil de se fazer, e os físicos precisam lançar mão de observações e análises bastante complexas.
Acontece que um estudo recente identificou discrepâncias no valor referente ao peso do Universo e, apesar de a anomalia poder se referir a um simples erro ou resultado de “ruídos” nas observações, pode ser que a diferença indique que existem elementos desconhecidos pelos cientistas no Cosmos, assim como a necessidade de que a Física faça uma revisão no Modelo Padrão da Cosmologia.
Balança cósmica
Para calcular o peso do Universo, os cientistas medem a densidade da matéria presente nele e o seu índice de aglomeração – uma vez que ela não se encontra distribuída de forma uniforme. Para isso, os físicos usam um efeito cósmico chamado “Lente Gravitacional Fraca”, que consiste em pequenos desvios na luz emitida por galáxias distantes provocados pela ação da gravidade dessas estruturas sobre a matéria que se encontra dispersa no Cosmos.
Peso pesado
Esse fenômeno, quando observado em uma única galáxia, não diz muita coisa aos cientistas, visto que o efeito é bem fraquinho. No entanto, se ele for medido em dezenas de milhares delas, o desvio (ainda que seja superleve) é mais notável. Ademais, é por conta dele que, na média, o formato das galáxias observadas aqui da Terra é elíptico quando, sem a lente gravitacional e considerando que essas estruturas apresentam orientação aleatória com relação ao nosso planeta, ele deveria ter forma tendendo mais para o circular.
Os astrônomos se basearam nesse efeito para calcular quanta matéria (convencional e escura) existe em uma grande parcela do universo observável contendo um elevado número de galáxias – uma região que abriga cerca de 15 milhões delas. Além disso, os cientistas também levaram em consideração a distância entre as galáxias, algo que é estimado com base no chamado “Desvio para o Vermelho”, que se traduz na quantidade de luz emitida por elas deslocada em direção aos comprimentos de onda mais longos do lado vermelho do espectro.
Discrepâncias
Os pesquisadores combinaram uma enorme quantidade de observações – conduzidas pelos projetos Kilo-Degree Survey (KiDS) e VISTA Kilo-Degree Infrared Galaxy Survey (VIKING), do Observatório Paranal no Chile – e compararam com outro monte de dados das mesmas galáxias, coletados pelo Very Large Telescope, que também faz parte do Observatório Paranal, mas é mais robusto, e pelos telescópios Keck, situados no Havaí. A partir disso, os cientistas conseguiram determinar a densidade cósmica da matéria na área examinada, obtendo um resultado chamado “Sigma-Oito”.
Esse mesmo trabalho tinha sido realizado por outra equipe de cientistas, mas os valores não batem. O outro estudo foi feito com base em observações realizadas através do satélite Planck, da Agência Espacial Europeia, que está focado em levantamentos sobre radiação cósmica de fundo em micro-ondas, ou seja, a radiação residual mais antiga do Cosmos, emitida cerca de 380 mil anos após o Big Bang. Nesse levantamento, os físicos mapearam variações de temperatura e a polarização da radiação cósmica de fundo de cada pedacinho do universo primitivo examinado na ocasião e, com esse resultado, conseguiram estimar qual seria o sigma-oito atual.
Diferenças de peso.
O valor encontrado no primeiro estudo foi de 0,81, enquanto o resultado de agora foi de 0,74 – criando o que os cientistas chamaram de “Tensão Sigma-Oito”. Os pesquisadores explicaram que existe uma pequena chance, estimada em apenas 1%, de que a discrepância seja decorrente de aberrações estatísticas causadas por ruídos capturados durante as observações, causando interferências nos dados. Dessa forma, pode ser que uma das equipes (ou ambas!) tenha cometido algum erro de cálculo.
Contudo, se uma checagem nos cálculos e a realização de novas observações descartarem essas possibilidades mencionadas antes, os cientistas terão que propor uma revisão do Modelo Cosmológico Padrão e uma reformulação de seus conceitos. Caso isso ocorra, pode ser que diversos mistérios cósmicos sejam finalmente desvendados, por exemplo a natureza e a proporção da energia e matéria escura no Cosmos, bem como a maneira que elas interagem entre si e com a matéria comum. Desse modo, é possível a ocorrência de descobertas e, com isso, a origem de uma nova Física.
Revisando o modelo
Esta não é a primeira vez que os físicos identificam discrepâncias em constantes cósmicas e uma revisão do modelo padrão é sugerida. Ademais da Tensão Sigma-Oito, existe a Tensão Hubble, relacionada à constante de Hubble, que consiste no ritmo com o qual o Universo está se expandindo.
Chegou a hora de propor uma nova Física?
Times distintos de cientistas chegaram a valores diferentes há alguns anos. Então, depois de rever os cálculos e avançar nos estudos realizados, hoje existe o consenso de que há 1 chance em 3,5 milhões de a diferença ser o resultado de uma mera casualidade. A Tensão Sigma-Oito ainda precisa ser mais bem explorada, mas essa anomalia se soma a outras que sugerem que a Física talvez precise passar por uma bela revisada mesmo!
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